and now for something completely different.

Sentia-se tão em baixo 
que acabou por lhe fazer um boquete.
Os problemas de linguagem por vezes são constrangedores,
e o rapaz nem se apercebeu que a estava a violar, tão ingênuo.

Na estação, um comboio parara e o guincho agudo fez-se ouvir por todo o vilarejo.
Como se nada fosse, como se nada importasse naquela noite estrelada, mas em parte sombria.
Passou um cão e fez-se ouvir,
ão ão.
E os latidos, em banda sonora de profunda intensidade bocal 
feminina, marcaram, para sempre, a lembrança da pobre menina.
A noite, por maior que fosse, não iria ajudá-la.

Sentiria, ele, remorsos, um dia mais tarde?
Eram questões que perduravam no tempo.
Não havia alento para a menina, não. Tanto que ao fim de 2 anos se suicidou.
E deus, por maior que fosse, não iria salvá-la.

Resultante em cadáver, os agora vestígios de carne putrefacta eram comidos por lagartos e bichos feios que, ao vê-los em vida, a fariam exclamar argh c'a nojo!. Não é ódio nem vingança, os bichos somente a comem porque se encontram famintos. É o ciclo da vida e a ordem natural das coisas. 
Mas e ele, que era feito do desviado membro do sexo masculino?
Terá ele partido para Banshee e, na qualidade de xerife, fodido todas as loiras da cidade?
Ou terá ele sofrido pela morte das futuras namoradas em acções irremediáveis de Walter White?
Mas a vida não é uma série de televisão. 
E infelizmente nem todos os culpados sofrem a devida pena.
Tomara que ele tivesse uma melga a chateá-lo todas as noites até ao fim dos seus dias.
E que cada cão que o visse, lhe ferrasse uma dentada na perna.

|em colaboração com Lita|

O abate da floresta de corações.

Roubava o nariz da avó, repuxando-o com o dedo indicador e o polegar entrecruzados no seu punho fechado, e dizia vovó, roubei seu nariz!. E todo ele, com 5 anos de alegrias inflacionadas ao sabor de caramelos, transpirava de felicidade ao sugerir ter roubado o nariz da velha. Perto, ao vislumbrar as graças do miúdo, o pedófilo tirava macacos do nariz. O amor é muito isto, roubamos segundos aos amados como narizes a idosas, e nem nos apercebemos que à nossa volta pode estar um vagabundo que no nos vai estuprar na noite fria.

O amor é a chama do pirômano mais virtuoso! 

entardecer metamórfico.

sentado perto do tanque dos patos, no jardim da Gulbenkian, 
ouço passos a vir na minha direção acompanhados de uma voz:
- HO ZÉ!
e eu tenho várias incertezas na vida, mas sei que não me chamo zé,
 sei que o meu nome possui mais que duas letras. e eu só quero estar sozinho, neste momento de introspeção, enquanto fumo um cigarro e miro o cu de algumas pretas que passam por aqui. enquanto, perdido no oceano de nicotina, acompanho o leve circular dos patos e penso foda-se, que animais harmoniosos! - ao mesmo tempo em que ganho uma vontade cada vez mais elevada em os degolar, esses animaizinhos estúpidos que parecem ter uma vida tão mais fácil do que a minha, mas ao mesmo tempo tão frágeis e acessivelmente comestíveis junto de batatas assadas.
a voz continua audível, a chamar pelo zé, pelo zé, pelo zé, em 
pequenos intervalos ela chama com entusiasmo o zé, e as minhas feições faciais sofrem uma mudança radical cada vez que a sinto mais audível, cada vez que pressinto aqueles passos mais perto de mim, e eu só quero estar sozinho, neste momento de introspeção, enquanto fumo um cigarro e miro o cu de algumas pretas que passam por aqui. a influência que esta voz começa a ter em mim é intensa, acompanha-me em cada pensamento de nostalgia, já nem consigo imaginar o degolar dos patos sem ter alguém a chamar pelo zé, o zé está em todos os meus pensamentos, o zé está no meu quarto enquanto me imagino na cama com aquela preta que passou há pouco. e isso não é nada harmonioso. e eu não me chamo zé, sei que não sou o zé e sei que sou uma série de não-coisas, sei que sou mais não-coisas do que sou coisas, sou um inúmero leque de não-nomes próprios, não-nomes comuns e não-nomes colectivos. 
sentado perto do tanque dos patos, no jardim da Gulbenkian,
levanto-me calmamente, como se a minha vida dependesse de me deslocar vagarosamente neste momento específico, mas a verdade é que não me apetece fazer merda nenhuma e já não tenho entusiasmo para pular de assentos públicos. tal como o meu cigarro, o tempo que dispunha para permanecer aqui terminou, os patos já esbanjam harmonia em demasia para mim neste dia, eu continuo a não ser o zé, e a realidade é-me uma mãe furiosa por lhe ter roubado dinheiro da carteira e só a sinto dar chapadas na minha cara. 
chapadas metafóricas, nem por isso doem menos. 

Desabitar-te de hábitos.

Querida,
redemoinho-me no interior do teu ventre, irás parir um amor por mim, disso tenho a certeza. E vai ser uma metamorfose do caralho (perdoa-me a linguagem)!! - dupla pontuação exclamativa para enfatizar. - Serás  o Gregor Samsa rejeitado dos amantes, irei eclodir em ti ausências depressoras, cagarás cartas de amor que em minha caixa do correio se esbanjarão de inúmeros folhetos informativos sobre merdas. 
Sim, eu nunca esvazio a minha caixa de correio.

A rejeição será a minha prenda para ti nesta vida.
Querida, não vale a pena sequer dedicares-me sonhos ou risonhos banquetes de satisfações a dois, a cova está aberta para depositar as palavras que me ofereces. Tudo o mais são sonetos, nunca serão 'só netos', porque nunca teremos filhos. E, deste modo, e não tendo mais nada a adiantar, quero que nem mereças a terra, quero que nem mereças o abrir da porta ou o nascer do sol. Vi-te nos Santos, de costas, ou pelo menos me pareceste tu. Só peço que deus, ou um alienígena de nome distância, sopre contra ti.

Foge, foge, enormíssima humana demente!
Ide alimentar histórias noutras paragens 
onde os meus pés não mergulhem.

Banhando-me de sorrisos sanguinários.

A lua desce ao teu encontro e afoga-se no rio,
tens os olhos a jorrar sorrisos e palavras em que me conforto no melhor dos copos transbordados de filipas. Há toda uma quantidade de prendas entrelaçadas, ocupadas em variadíssimos formatos de papel, à minha volta; e, quando as abro, na inocência da espera de algo doce (como o levantar da saia da menina do prédio da frente, em dias ventosos), saltam pontapés e diálogos desconhecidos no batuque da expressão facial que se abre da extremidade esquerda até à extremidade direita da boca.

Enrolado no sofá a beber xícaras de café, debato-me com duas questões: será que o comprimento do meu dedo grande do pé esquerdo é perfeitamente idêntico ao comprimento do meu dedo grande do pé direito? e o que haverá debaixo de um sonho? - neste momento, em que crio a ilusão de aquecer meu corpo do líquido ardente, dissipam-se-me tais preocupações e começo a pensar que talvez os meus lábios ganhem um ferimento proveniente da quentura extrema outrora protagonizada pelo café. Não sei até onde irá esta minha preocupação, pois sou um gajo muito distante de manter uma linha de raciocínio indeterminadamente, e já me caiem filipas pelos pés, todas as minhas unhas crescem agora regadas de filipas como se fossem sóis ou rissóis elaborados com a mais suave imprevisibilidade, banhados de sorrisos sanguinários.

a minha meta é uma linha queixosa de vencedores, mas que, ao mesmo tempo, se encontra sempre a cochichar com as bancadas, e torna-se difícil manter uma certa dose de seriedade em alcançar um destino quando ele não te leva a sério e, na pior das hipóteses, talvez entre os cochichos lance uma ou outra farpa em relação a ti. por vezes, em momentos semelhantes, o melhor talvez seja procurar outra solução. e, na ausência de soluções, voltarmos a debater se realmente o nosso dedo grande do pé esquerdo cheira melhor ou pior em relação ao dedo grande do nosso pé direito, e porque é que ainda ninguém veio limpar este chão afogado de filipas, com abraços, com cabelos despenteados de energias dançantes, ou declamações viajantes, mas não tragam uma esfregona. não queiramos voltar ao mundo da realidade, quando tão bem alcançamos o sossego que nos torna cativos quando estamos juntos sem pensar sequer na presença um do outro. 

Como uma cama de papel.

Desenrolo-me e enrolo-me, fundo-me nos lençóis, até me aglomerar da ausência dos lençóis: o lençol já me rejeitou, tão cansado dos meus pontapés; e a manta (confusa entre ser tecido espalhado no chão ou meio tecido que se desagua do colchão) está como prisioneira das bordas da minha cama, na espera de fugir. Não arrefece os meus desejos de quentura. Completamente ausente da esperança de me atar em sono, desfaço o nó que me liga à acção, rejeitando qualquer vontade de movimento.  O meu caderno, onde efectuo diversos registos de gritos da alma, parece germinar em palavras, assim, despido, deixado ao acaso, aberto em qualquer página de letras sangradas à força de empenho em bater em alguém. A meu lado direito, o caderno parece mais desassossegado do que eu. De olhos fixos em mim, branco, pede-me para o pintar. Quase que me parece suspirar ao ouvido tenho mais páginas em mim, magoa-me como se eu fosse o propósito da tua (des)concertação. E eu, nu, na sintonia dos silêncios da noite, imagino-me repleto de folhas escritas à mão, leves como o beijo de uma boca e quase quentes como ela. Há uma conspiração para eu não me esquecer de tudo isto que transpira em mim, que me maltrata em machadadas de palavras. Como uma vírgula às vezes pode ser tão mais difícil que as olheiras de amanhã...

Tenho o corpo cheio de expressões idiomáticas, cobrem-me como se fossem o manto, revestem-me como se fossem o fumo sujo de nuvens de cigarro à minha volta. E quase perco a esperança de me antever noutro cenário que não este, quase me deixo escapar à tentação de negar o sono. Aqui, nesta floresta que é só um quarto, cada erva que cresce é um poema em forma de vulcão onde todas as estações de comboio podem rumar a qualquer estação no poder da liberdade. Tenho o meu corpo ocupado com rasuras e feridas e amores que eu trinquei na tarde que adormecia ao pôr-do-sol. Tenho em mim todos os recantos das memórias que me consomem em isqueiro aceso, todos os conselhos das viagens que já fiz e dos passos na solidão com os outros e comigo. E, brilhando como as estrelas, como um sonho, as folhas quase parecem dizer não te preocupes, amanhã vai estar tudo bem.

A capacidade de ser ninguém.

adivinhei-te no banheiro comigo, aquele banheiro vertical onde se toma duche e que deve ter um nome referente que não me recordo agora. recomeçando. adivinhei-te no teu *palavra que não me recordo* comigo, aquele que tens ao lado da sanita que em mijadelas já me inspirei em pressionar a mangueira com as minhas mãos. espera, isto não faz sentido, vou recomeçar novamente: adivinhei-te no teu duche comigo, aquele que tens no canto da tua casa-de-banho ao lado da retrete. fechei os olhos na paciência da tarde causadora de olheiras mais extensas pelo breve sono matinal dormido e sei, recordo-me, que o meu orgão peniano estava em ângulo recto, proporcionalmente bem localizado ao teu buraco anal. algo que me agradou, confesso, vires ao meu inconsciente sem pedir licença e ficares assim, nua, de costas para mim, quando o meu desejo é mesmo vilipendiar-te, mas com ternura; talvez violar-te, mas isso não teria sentido, apareceres assim, deixares que esteja mais tesudo que uma marmota tesuda congelada sempre com o pirilau congelado em posição de foda, deixares estar-me assim a teu lado só pede mesmo que te trate sem carinho. adivinhei-te, na ternura dos teus lábios meu músculo tenso, esse músculo clemaster que eu possuo por ser um ser do género masculino. e tudo começa com um bom banho, para ficarmos bem limpinhos no exterior e no interior: deixa que o meu bicinho seja a escova de dentes dos teus buracos, bocais, retais e vaginais, deixa que te permite jogar ao berlinde com a tua língua. tu sabes, isto é tudo um texto de merda, isto não interessa, cavemos um poço mais fundo que a profundidade vaginal e enterremos isto até mais não e sem orgasmos, não há orgasmos em funerais, mas porquê?  porquê se é quando enterramos um nosso bem mais precioso o mais fundo possível? não deveriam entoar orgasmos simultâneos ao envés das monótonas tretas proferidas por um gajo com um terço que acredita que lá em cima há um ser todo poderoso que nos criou e nos protege e que, no fundo, é um nosso anjo da guarda, mas daqueles anões e com lepra, que não nos protegem de levar uma tareia de apalparmos o cu à namorada do António? Ah, não, mas isto é tudo muito bonito, sermos tão protegidos assim, estarmos como no topo de uma pirâmide, acima de todos os aliens e animais que são inconscientes mas que talvez tenham sentimentos e fodem mais do que nós, o que é triste, um caracol foder mais que nós, um animal que demora um caralhão de tempo a percorrer um quilómetro e que nem tem piroca visível ao olho humano. mas a sério, convida-me aí ao teu banheiro, ou banheira, ou lá como se chama essa merda vertical que alguém tomou a liberdade de criar para possibilitar um melhor acesso e facilidade à concretização de um duche, e vamos suar conjuntamente diante das partículas de água que caiem dessa mangueira que deita água para cima de nós. depois, quando nos secarmos, podemos trocar uns beijos, é sempre querido, ou então vamos matar alguém, o que é sempre um acto de extremo agrado para libertar o nosso ódio. ao final da tarde, de mãos dadas no chafariz, depois de uma longa caminhada no parque, curvamo-nos ao mesmo tempo para beber aquela pequenina água que dança e chafurda as nossas bochechas rosadas, as tuas mais que as minhas porque és uma tipa tímida e isso dá gozo quando te possuo. assim, como animais dançantes, vamos andando, aqui e ali, umas vezes pensando com a cabeça, outras deixando a cabeça pensar por nós. ou em nós. em ti. deixá-la penetrada como um prego na parede, mas daqueles que tremem quando há furacões ou tornados que têm sempre nome de mulher. porque toda a mulher é fudida.