A Lua desaparece por detrás de uma nuvem, mas não voltará a chover. Ele não respondeu. É uma hora e um quarto. Ela deixa de o ver enquanto a nuvem passa pelo céu. Depois o céu liberta-se dessa nuvem. Não choveu. Ei-lo que reaparece, à volta da chaminé, ainda imóvel, imutável, eternamente preso àquele esconderijo derradeiro.
-Imbecil - grita Maria.
Ninguém acordou na cidade. Nada acontece. A forma continua envolta na sua imbecilidade. No hotel nada se moveu. Mas uma luz surgiu à janela da casa ao lado. Maria recua um pouco. Tem de esperar. A luz da janela apaga-se. Não pode gritar mais. O grito vinha do hotel, de um turista. Por isso as pessoas regressam ao sono. Uma calma mortal recomeça. E nessa calma, Maria continua a insultar.
- Imbecil, imbecil - diz ela, baixo, agora comedida.
Eis de novo a patrulha. Maria deixa de insultar. A patrulha passou. Falavam da família, do salário. Se tivesse uma arma, Maria alvejaria a forma. Para que tudo acabasse. A blusa de Maria cola-se-lhe aos ombros, molhada de uma chuva que nunca mais seca. Ainda não. Tem de esperar o alvorecer e a morte de Rodrigo Paestra.
Ela já não o chama. Ele sabe-o. Ela abriu de novo a porta do corredor. Ela vê, ela vê os outros, que dormem, numa cruel separação. Ela demora neles o olhar. Ainda não se consumou, aquele amor. Que paciência, que paciência, ela não deixa a varanda. Ele sabe, Rodrigo Paestra sabe que ela está ali. Ele respira ainda, ele dura ainda nessa noite que acaba. Ele está ali, no mesmo lugar, geograficamente unido a ela.

Ps: Todo o texto acima foi retirado ao livro em questão e pertence-lhe. O livro é constituído em vários capítulos e a selecção acima é da responsabilidade do administrador do blog. Perdão por qualquer erro que possa ter cometido.